segunda-feira, 29 de julho de 2013

Satisfeito

bom mesmo
é quando um dia dura uma semana
os relógios não contam nada para ninguém
e os ponteiros só servem para palitar os dentes

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Analítico

Tenho muito observado
       e pouco feito

Minha maior qualidade
 meu maior defeito.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Relatos psicografados, seguido de um depoimento gravado em fita.

Era feito de cores monótonas aquela sala em festa. Eu estava sentando ao chão, um velho costume. De fronte ao shisha, pessoas em pé me cercavam, algumas bebendo e algumas outras falando, mas definitivamente todas fumando. As paredes eram todas brancas, de uma decoração minimalista, nada de exageros, com exceção dum quadro horrendo pendurado na parede. Que eu apreciava com o olhar de um cãozinho que espera o afago do dono. — Havia mais sinceridade na fumaça dos cigarros do que nas palavras cuspidas. Eu novamente me encontrava só, ao redor de tantas pessoas e não havia pelo menos um drink em minhas mãos para me abstrair da paisagem que me consome como um narcótico. Na cozinha, abri a geladeira branca como se fosse o anfitrião. A primeira garrafa que vi foi a de rum branco. Um pirata feliz e um papagaio sobre o ombro no rótulo. Quem me dera um papagaio e um tapa-olho.

Não sei, o que me atraiu nele? Foi o olhar melancólico? Talvez o jeito desinteressado e desgostoso que soltava fumaça pela boca. O silêncio. Ou era indiferença que tinha pelos presentes? Acredito eu, que fosse o aspecto sem forma, de quem não se encaixa, de alguém que eu não saiba nada e não quer saber de nada. Talvez, o jeito em que segurava a garrafa numa das mãos e na outra um copo. O jeito que olhou para o rótulo e abriu um sorriso. Com certeza, eu queria devorar o mundo que estava dentro daquela cabeça.

—  Vai beber tudo sozinho? Porque não dividi isso comigo.

Quanto tempo ela estava a me observar? Será que viu quando eu bebi do gargalo. Quem se importa? Peguei um copo pra ela e o enchi. Ela me observava fixamente. Entreguei o copo na sua mão, ela mexeu os lábios sem fazer ruído: "obrigada", disse. Sentamos à mesa da cozinha. Ela tinha os cabelos loiros e a pele clara. Não contrastava com a casa, mas contrastava comigo. No seu rosto estava desenhado um triângulo equilátero: duas pintas abaixo do olho e uma solitária pinta na bochecha. Ela fez uma expressão irritada, aguardava uma pergunta minha?

— Gosta de rum branco?
— Não muito. Na verdade, qualquer coisa já tá bom.
Nesse momento, não estava falando do rum.
— Tá gostando da festa?
— Pra falar a verdade, não. — Abriu um sorriso sincero. Existia uma leveza naquela situação.
— Costuma sonhar? — Ela pensou um pouco, como quem faz uma estatística.
— Acho que sim.
— Já teve vontade de matar alguém?
Houve um breve silêncio, logo ela, rindo, respondeu:
— Não seja tolo, claro que já. — Bebemos o nossos drink, desviando assim nossos olhares. Vi ela, que observava curiosa meu gogó enquanto bebia. Desviei os olhos pro pescoço, descendo. Não eram fartos, como costuma fantasiar a maioria dos romancistas mas.
— Você tá a fim de dar uma volta?
Ela ainda estava bebendo e quando terminei de falar a sentença, apressou-se para responder:
— Vamos!

Havia nele uma singela sensibilidade para um diálogo esquisito, pra não dizer ruim. A proposta que ele havia feito, eu esperava por algum tempo (desdo começo da festa). Não podia recusar, ou não. Será que, aos botões, ele ouviu o que estava dizendo? Quem se importa! Apressei-me, sequei o copo. Ele fez o mesmo. Abri a geladeira da mesma maneira que ele havia feito, peguei a garrafa e saímos daquela casa imunda. Eu imaginava que ele dirigisse algum carro esportivo com teto solar ou um conversível que ele usava pra cruzar a autoestrada rumo ao desconhecido, mas uma lata velha com motor à diesel, convenhamos. Pelo menos era bem cuidada, o carro tinha um cheiro de tiozão. Eu nunca gostei de príncipes encantados. Ele não havia dito uma palavra. Isso me incomoda. A única coisa que fez além de dirigir foi ligar o som.
— Gosta? — disse ele.
— Do que?
— Da música.
— ...Sim, nunca tinha ouvido.
— É eu também.
Algumas coisas se diz apenas por simpatia mesmo.

Ele estava compenetrado demais no transito e ela à deriva.

Se ela entrou no carro então deve estar preparada. Ou será qu'eu devia perguntar? Ela já deve desconfiar. A música pode abafar o silêncio mas nunca calá-lo nada pode calar o silêncio. Calar o silêncio? Que tipo de devaneio estúpido é esse? Ela parece uma daquelas niilistas. Daquelas que roubam o namorado da irmã e abandonam a casa dos país para viver como uma junkie ou qualquer coisa assim. Alguém que não quer ter a voz abafada. Não quer ouvir o silêncio do mundo quer berrar bem alto mandar todo mundo ir pra PUTA-QUE-PARIU!

— Me lembrei — disse ela. Ele olhou com uma das sobrancelhas levantadas — me lembrei do sonho que tive. Eu estava dentro do vagão do trem. Não-sei-bem onde, foram-me rara as vezes que entrei dentro de um. Estava escuro, acho que era de noite. Havia um olhar sobre mim, era um olhar pesado, sabe? Aquela sensação desconfortável de filmes noir. Eu olhei para trás e era um homem que tinha metade do rosto encoberto em penumbra. Era um homem que tinha estampado no rosto um sorriso de sátiro. Acredita em acaso? Não importa. Esse homem se aproximou de mim e sentou-se ao meu lado, sussurrou no meu ouvido: Eu pego ele e mato. Parecia um pervertido sexual. Nojo só me recordar.
— Freud explica. Mas não entendo nada de sonhos, pra mim são todos non-sense.
— Assim como a vida? — respondeu ela sorrindo.


Eu não sabia responder, se:
 a) aquilo havia sido um sinal
 b) ou não
Mas o sonho lembrou de alguma notícia recente, acho que, sobre um tarado que andava nos ônibus e nos trens que, em garotas alheias, ficava esfregando o.

Não respondeu a minha pergunta. Impaciência, procurava algo. Algo pra me mostrar e falar.
— O que cê.
— Estamos chegando lá.
A frenética paisagem urbana. Estamos num bairro nobre.
— Aonde vamos?
— Já vai ver. — Abriu o porta-luvas, pegou o óculos escuro e.
— MAS QUE MERDA É ESSA?
  Ele riu.
— Até parece que nunca viu uma arma — Eu tremia, ele continuou falando.

Entrei no drive-thru. Sei que não era o horário apropriado. Se bem que nenhum horário é apropriado.
— Quer algo pra comer?
— N-ão.
— Ok, eu vou pedir.
Me virei pra atendente, fiz o pedido.

Eu queria correr, abrir a porta e fugir. Mas estava longe demais de casa, o conhecido mais perto seria meu ex. Prefiro ficar aqui. E se ele resolvesse me matar? Seria simples, um tiro e tudo estaria terminado. Teria um pouco de sujeira, mas, nada que ele não estivesse acostumado a fazer. Aposto até, que, deve ter alguém que trabalha com essa espécie de limpeza. Não importa, seria simples. Ele recebeu dois pacotes: o primeiro com hamburguer, batata frita e refri, o outro tinha uma embalagem plástica preta, lacrada.

Rasguei o plástico com os dedos. Folhas e folhas com informações inúteis.

— Uma coisa que eu acho engraçado da humanidade é que, sempre fazemos coisas inúteis, por exemplo: imprimir numa folha um aviso sobre o desmatamento de arvores. Sendo que as próprias...

Aquele blá-blá-blá inútil dele era pior do que receber um tiro.

O endereço era do outro lado da cidade, a vítima? FODA-SE o que ele fez, ou deixou de fazer, ou pior, quem ele é. Não tenho saco pra ler essas biografias mal escritas, que o M. gosta de narrar pra secretária. O que ele espera com isso? Compaixão? Sentimentalismo? Se bem que ele deve se divertir narrando.

Enquanto ele dirigia, comia e falava besteira, constantemente falando: "quer um pedaço?", "fritas?", "um gole?". Aceitei o gole e a fritas. Lembrei que ainda havia aquela garrafa de rum. Misturei com Coca.
— Cuba libre!

— Sabia, que no México eles só chamam de Cuba?

De novo: informação inútil.

— E em Cuba só se chama Libre.

Ela tem um péssimo senso de humor.

Chegamos ao local. Um casarão de esquina. Casa de swingue, não é o nome apropriado, o correto seria, parque de diversão para adultos, muito melhor assim. Parei o carro na calçada. Olhei pra ela, parecia meio tonta. Me olhei no retrovisor: agora ou nunca.

Ele abriu a porta e foi indo em direção à casa. O que faço? Sigo ele. Fico aqui. Sigo ele? Fico aqui?

Ela veio correndo, parecia desesperada. A arma estava no coldre. Abri a porta e fui entrando. O lugar era bem iluminado, uma recepcionista usando um vestido vermelho longo, de cabelos cumpridos, lábios carnudos. Me perguntou se eu tinha hora marcada. Respondi que estava ali a negócios, que havia chego uma leva de garotas da Croácia que.
 — Você está atrasado senhor — Ela procurou o nome na lista.
 — ...
 — Me acompanhe, por favor

Tinha um cheiro esquisito, me dava um pouco de medo aquela decoração. Alguns homens de terno, abonados, cagavam dinheiro. Passamos por uma sala, onde havia uma mesa de vidro e fileiras enormes de coca. Outra, com uns quinze homens ao redor de uma loira e uma asiática, eles uivavam em êxtase, arremessando dinheiro como quem alimenta os pombos. Em que parte do universo estou? Não posso ficar muito longe dele.

Não faltava distrações, nem perversões. Aquela loirinha de pelos dourados, ficou pra trás, junto com os playboy. Lembre: você está trabalhando. Desci as escadas que davam para o porão, ela abriu a porta. O lugar estava mal iluminado. Se ouvia o chicote cortar o ar, e num estalo macio e áspero tocar a carne, um grito de prazer sufocado. A única coisa que reluzia era o látex da roupa. Um-alguém, como um cachorro, estava sendo sodomizado. Gritava de dor ou prazer?

Ele perguntou quem era. Ninguém respondeu. Dois estampidos secos reverberaram pela sala, junto com um flash muito rápido. Acenderam a luz, e tava lá, um gordo com roupa de látex, deitado no chão, sangrando e agonizando.

Tenho que dar o fora daqui, acho que matei o cara errado. Matar todo mundo? Supudondo não deixar provas. Que bosta, aquele é o cara.

QUE HORROR! Disparou mais uma vez e acertou a cabeça de um. Era possível ver a massa visceral espalhada pelo chão. Um vermelho vívido pingava. Comecei a me sentir enjoada, uma sensação de desmaio.

A babaca não parava de gritar e parecia pálida.

— Vamo dar um fora daqui! Vamo dar o fora!!!

Ela não respondia nada, tinha o olhar petrificado, perfurado pelo projétil. Puxei ela pelo braço. Fomos voltando. Um segurança surgiu, me telegrafou um soco à metros de distância. Com uma rasteira derrubei-o no chão, outro tiro. Segurei mais forte o braço dela, e puxei até a saída. Entramos no carro, estava fácil demais. Queimando pneu, sai em arrancada. Abriram a porra da porta do bagulho e saíram nos alvejando. Um dos tiros acertou a lataria da caranga. Filhos da puta! Corri pelas ruas mais estreitas a fim de fugir. Eu não tinha pensado numa rota de fuga. O improviso faz parte. Mas teria sido útil ter pensando sobre isso antes. Um segurança me perseguia de moto, destruiu o retrovistor com um tiro. Caralho! Foi depois de entrar na contra-mão, atravessar semáforos fechados e ser fotografado por alguns radares (QUE MERDA!). Consegui despitar os viados.

Ele recebeu uma ligação logo depois da fuga. Era o chefe dele, parecia calmo. Não perguntou sobre nada, só disse que queria vê-lo. Demos mais algumas voltas. Fumava cigarro atrás de cigarro e bebia o rum puro. Não queria abandonar o carro velho. Fomos nos afastando da cidade, em direção a periferia. Não sei dizer exatamente onde, até porque não conheço bem a cidade. Quanto tempo estou aqui? Dois meses. É vim de Curitiba. É lá as coisas são diferentes. Não sei explicar. Não sei. Já disse que não sei. Olha, você vai deixar eu terminar a história? Ele parou o carro numa esquina. Três minutos depois apareceu um menininho moreno, com as roupas meio de desbotadas, estava descalço e nos pediu um cigarro. Eu não fumo, deixa os dentes amarelos. Ele também recusou a dar cigarros. O menino saiu. Surgiu um carro preto fosco. Não entendo de modelos de carros. Sei somente que era preto fosco. Ele encostou do nosso lado, abriu o vidro, pediu para que seguíssemos. Ele ligou o carro e fomos atrás. Pra piorar a rádio tocava um sertanejo universitário. Entramos num garagem, cheia de peças de carros desmontadas e cabos de ferro imensos. Ele mandou eu ficar no carro, mas na hora que ele abriu a porta. Eu não pude ver, só ouvir. Depois disso eu não lembro de mais nada. Acho que desmaiei. Não sei bem o que aconteceu. [...] Sim, esse da foto é ele. É acho que era roubado o carro. Eu já disse que não sei. [...] Quando vou poder voltar pra casa moço?

Decoração

o fantasma de vovô
continua pedalando
na bicicleta inerte

sábado, 13 de julho de 2013

Outono (Vinho)

Folhas de 
tentações secas
amareladas 
e outonais
pontilhando
quarta
quinta 
e sexta
dos dias 
sete 
ou oito
folhas

quarta-feira, 3 de julho de 2013

?

Sou a constante negativa positiva
as duas respostas corretas
que o contrário se deixa pensar
a aranha que se move na água
ou um extinto animal
de uma espécie comum
atleta perseguido
pela sua preguiça
e despreocupação
com o espetáculo

meu único objetivo
é o caminho de hoje
apesar de impreciso

se os erros levaram
a humanidade evoluir
escrevo e sobrevivo
enquanto isso for um erro