sábado, 21 de julho de 2012

Nôctiluz

Entretido com a fumaça do tédio azul
ante à fossa-noite luminublada
que'm fenda aberta mostra suas presas cinzentas
Insisti insone aos noctassonhos-mortos que me'nvolvem em incensos ao cárcere do tempo.


Ao meu umbral escuto o toc-toc de amargas mãos que escorrem
um insustentável-atemporal momento imóvel de movimentos arrastados
do olho-mágico observei a saudade que estava aos murmúrios das tuassombras.


O que fazes à minha porta?

segunda-feira, 16 de julho de 2012

O infinito é uma rua

          E eu andava de bicicleta quando nos encontramos           
Na esquina da rua onde a alegria quer a eternidade        
                a dor passa de ônibus

Eu ando de saudade

sábado, 14 de julho de 2012

Bilhete para Denise

Em baixo do telefone sem-fio que tem a piscando sua luz vermelha, avisando que se tem uma ligação perdida, e também em alguns lugares espalhados pelo apartamento e grudado por um imã, que ela comprou numa viagem pro Canadá, na geladeira branca com os detalhes cinza, um bilhete:

"Minha Querida, sei que não aguentas mais minhas crises e toda a baboseira que estou ultimamente falando, sei também que estás tristes e que também tem os teus problemas, e que existem coisas na vida que não param. Me sinto um grande peso em sua vida, queria ao menos poder ajudar em casa, mas parece que um buraco negro me sufoca e engole todas as minhas vontades, — e eu pareço ser o seu buraco negro — Tenho pensando muito... Sei que já deveria ter saído desta crise, mas parece que sempre existe um problema. Acho que talvez sempre existirá um problema. Não sei. A vida é pra ser assim mesmo?
Estava pensando... — Eu — sou o seu maior problema, sempre te deprimindo e te deixando irritada com minha rotina de reclamações e rabugentices. E concordo com esse pensamento, sabe, realmente é humilhante pensar nisso, e notar que é verdade. A verdade é cruel, — porém é necessário ser cruel —.
O que eu estou querendo dizer, mas que é difícilimo dizer é: Estou partindo, farei uma viagem, voltarei pra casa da minha mãe, morarei com algum colega... Não sei o que farei, mas farei logo. Na verdade neste momento já devo estar longe, em um qualquer-lugar que vida me abandonou. Estou farto de ver que tu além de carregar os próprios problemas, me carregas com os meus problemas. A vida podia ser fácil. Me desculpe por não ter a coragem de te olhar nos olhos e te dizer isso, mas pensar que você ouviria tudo isso da minha boca, me deixa triste. Você ouve minha voz enquanto lê este bilhete? Tudo me deixa triste, por isso estou partindo para ver se encontro a alegria em algo que não-sei-onde perdi, ou deixei escapulir. Desculpe e adeus Denise. De alguém que te só te prejudica e que só quer o teu bem."

Ela chegou em casa do trabalho da pausa para o almoço, encontrou a casa vazia. Estranhou, mas ela sempre se estranha com qualquer coisa, logo ficou tranqüila. Se acostumou. Abriu a geladeira pra esquentar a comida. Não viu o bilhete. Enquanto a comida esquentava dentro do gélido microondas branco metálico, avistou que havia uma ligação perdida no telefone sem-fio. Viu que a ligação era do telefone dele, e logo percebeu que havia uma página da sua agenda, uma página amarela (que ela tanto gosta) fora arrancada. Pegou o bilhete com a mão direita, e começou a ler. No começo estava confusa "o que ele tá querendo dizer com isso", pensava, "esse babaquinha com as suas idiotices...", quando chegou ao final, não sabia o que fazer, tirou o brinco, se olhou no espelho torto que ele havia posto assimétricamente (acreditando que estava simétrico) e desalinhou o cabelo até que o reflexo no espelho parecesse correto. Um pranto escorreu, dando inicio a um riacho deles que fluíram... Se jogou na cama com a cabeça na travesseiro, abafando...  O microondas apitou, mas já estava sem fome. Sem forças.

Foi neste momento em que ela ouvia a maçaneta de casa se abrindo, correu para a pequenina sala do apartamento, sentou-se na cadeira que era de frente para a cozinha do lado da mesa em que ficava o telefone. Era ele, pelos passos era ele. Pela respiração forte, era ele. Com certeza era ele. "Chegou de mansinho o danado", ele entrou na sala e cumprimentou com um beijo, tirou o casaco no quarto, voltou para a sala. O microondas apitou pela quinta vez, mas a primeira vez desde que ele chegara. "Onde você estava?" perguntou ela engolindo um soluço choroso, que o fez olhar meio torto, não entendendo bem a situação que estava. "Fui encontrar um editor. Acordei hoje com uma idéia, e que comecei escrevendo hoje mesmo, me pareceu fantástica, o editor também gostou da idéia, acho que vou continuar trabalhando enquanto ainda está tudo fresco, por sinal, você deu uma olhada pelos textos que escrevi e deixei espalhados pela casa? Acordei inspirado".

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Edifício Babel

Na rua X, ao lado do banco do Y está o famigerado Edifício Babel. Subindo os quatro degraus da escadaria você chegará ao hall de entrada, onde será recepcionado pelo porteiro que estará dormindo. Não se preocupe, as vezes ele acorda. Subindo pelas escadas, percebera que entre o térreo e o primeiro andar existe um outro piso no meio que possui uma porta, que segundo constam é onde o Dono do Edifício fica trancado, calculando as despesas e somando os lucros. No primeiro andar existe uma academia somente para não-moradores do prédio, normas do Edifício. No segundo andar existe uma portinha que nos leva para uma queda direto para a rua. Se pegarmos o elevador (economizaremos tempo e pernas) chegaremos ao sexto andar ou até o nono rapidinho, onde se encontram os moradores do prédio; uma micro-sociedade cosmopolita de estudantes, regida por regras seguindo o livro Bom-viver em Harmonia; Micro-Sociedades. Livro pequeno de em torno de 72 páginas, com tradução para francês, inglês, español, italiano, alemão e russo, que pode ser adquirido no apartamento 918, onde o autor ficara contente com a sua visita e provavelmente fará um dedicatória no exemplar (que o próprio acabará por lhe dar de graça). 
Por terem abdicado de alguns conceitos, ficando vagos de datas comemorativas, os moradores estipularam algumas datas, além de que cada aniversário é mui bem comemorado por todos. Existe uma festa que acontece no primeiro sábado à tarde de cada mês chamado Finem, e outro na manhã do ultimo domingo chamado Initium.
No Finem geralmente é feito lasanhas, arroz, feijão, batatas, beringelas... Tem também um banquete frutas onde é servido melancias, laranjas, tomates e... As vezes alguma bo'alma guevariana faz alfajores e outros doces, de praxe reclamam da qualidade do leite condensado da Ilha de Vera Cruz, enfim, eles não são perfeitos.
No Initium é feito uma festa com vinhos, hidromel, cachaça, fernet, vodka, cerveja, rum, tequila, qualquer alcoólico é válido. Outros eventos também são realizados rotineiramente onde algumas bandas são apresentadas, malabares, pequenas peças teatrais, alguns pequenos curtas feitos independentemente.

Nenhuma sociedade é perfeita, principalmente porque nossos manuais não estão traduzidos em línguas orientais (apenas o russo), o que torna difícil a convivência com coreanos, chineses e japoneses. E as vezes em momentos de discórdia, de extrema raiva, de quando alguém acha que outro-alguém mordeu o seu queijo que estava na geladeira ou tomou o seu refrigerante de gengibre, ou até mesmo tomou banho e transformou o banheiro em Atlantis, ou cozinhou uma comida gosmenta e papenta na panela e não lavou a mesma, os habitantes simplesmente não reclamam, guardam para si todo o rancor e escrevem um educado bilhete. Esperam que tudo se resolva num relampejo de bom senso.

No seu meio andar, diante de contas numerosas e pilhas de dinheiro, cercado por fios e máquinas de contar que fazem bip-bip e piscam luzes verdes. Está ele, o mestre varonil, o Senhor Dono do Edificio... que segundo os seus cálculos aritméticos, viu uma margem de lucro muito maior do que a esperada, com a quantidade enorme de pessoas que ligam pra ele frenéticamente. Trim-trim, trim-trim.

— Alô? É sô eu, o Dono do Edifício... Hmm... Quanto? Não, não, não... Ah sim, sim, tem um quarto vago no 1041...

Desligou o telefone e teve uma epifania; construiria uma banheira de hidromassagem e com um pole-dance no meio para que Martha (sua boneca inflável) pudesse se exercitar, afinal ela andava de carinha tão murcha. Pegou o telefone, discou para o número e ligou para o seu maior investidor.

— Alô maninha? Tudo bão por ai? Desculpa trapalhar tua férias em Fernando de Noronha, má é qui tamo com todo os quartos de todo os apartamentos lotado, e eu não sei o que fazer...

Logo depois de ter construído sua banheira de hidromassagem com um pole-dance no meio e uma sauna, obedeceu as ordens de sua irmã; construiu mais andares para o prédio, e mais andares, e quanto mais andares iam sendo construídos mais pessoas lotavam seus apartamentos e quartos. Chegou a um ritmo em que os pedreiros trabalhavam setenta e duas horas por dia. O Edifício Babel em pouco tempo tornou-se o maior da cidade, do estado, do país, do mundo... Ele estava cada dia maior e cada dia com mais gente.

No começo os moradores seguiam e conseguiam compreender as regras, mas com o crescimento acelerado de pessoas no edifício começou a se tornar difícil a assimilação e a disseminação do livro Bom-viver em Harmonia... Resolveram o problema, criaram um dialeto babélico que era uma mistura de várias línguas e expressões que foram geradas espontaneamente. O dialeto era de fácil aprendizado para todos que já estavam familiarizados com o excesso de informação léxica estrangeira-nativa, trataram de utilizar um alfabeto que não tinha nada a ver com o alfabeto latino ou anglo-saxão, nem mesmo com o cirílico, voltaram as raízes, fizeram do alfabeto hebraico o alfabeto materno do Edifício Babel.

Com 810 andares o Edificio tornou-se caótico, o fluxo de pessoas saindo e entrando pelos elevadores, de pessoas subindo e descendo as escadas era enorme. O livro Bom-viver em Harmonia; Micro-Sociedades, tornou-se obsoleto, o livro servia somente para as micro-sociedades pacatas, não para um aglomerado imenso de pessoas na vertical. Com o passar do tempo as pessoas começaram a infringir as regras, pois regras exigem um policiamento e punições aos que não a seguem. E aqui não existe castigo, não gostamos disso, apesar de que alguns acreditarem que deveria existir punições. Creio que não seria justo, porque os orientais continuam excluídos, completamente perdidos, fora do circuito, e não seria justo puni-los sem que eles saibam do que se trata as tais regras, mas Pierre Têtu acredita de que os orientais só não se informam das mesmas por má fé, pois alguns até sabem falar mais de uma língua.

Um belo dia Pierre acordará ao meio-dia e ao abrir a geladeira, percebera que o seu recém-comprado iogurte de morango já se encontrava vazio e com o recipiente malandramente deixado dentro da geladeira. Chamou um amigo brasileiro metido à lutador de MMA e foram até o quarto do sujeito de olhos pequenos que morava no apartamento e lhe deram uma genuína surra. Poucos ficaram sabendo. O jornal do Edifício estava mais interessado em ensinar a fazer massas de pizza do que nesse pequeno incidente. Estranhamente o caso, ganhou uma grande reverberação pela sociedade oriental, que acabou criando uma disputa. Rixa essa que exigiu que fôssemos todos separados por grupos, que tiveram que usar uniformes especificos para não serem atacados.

Os que se vestiam de azul eram o que eram a favor do castigo, da servidão as regras, muito agressivos, batiam a quem bem entendem-se ser justo. Os que se vestiam de vermelho eram na maioria das vezes os orientais, ou simpatizantes que eram contra a ideia repressora, acabavam sempre apanhando, mas estavam sempre fazendo planos para dominar apartamentos de alguns dos lideres do outro grupo. E os que vestiam branco ou cinza eram os neutros, que eram a favor e contra ao mesmo tempo, porque analisavam tudo como errado, porem eram muito fracos para fazerem o certo, então se disfarçavam na própria fraqueza e eram indiferentes aos gritos, as brigas que aconteciam constantemente nas escadas e corredores, eram acomodados com a violência, e sim, eram parte fundamental para que aquilo continuasse.


*****


Mudei-me para outro edifício, esse onde só existiam pessoas da mesma pátria, a vida era mais monótona, éramos mais egoístas e estávamos pouco nos lixando para o que o outro fazia — desde que isso não atingisse ninguém. Não se passou muito tempo, em torno de duas semanas, até que me apareceu um colega de trabalho durante a pausa do almoço, dizendo da ultima; "...um edifício tombou na rua X, ao lado do banco Y...", e também seguiu contando uma interessante história sobre o edifício, "...o Dono do Edifício possuía a chave-mestra que lhe dava possibilidade de abrir a porta de todos os apartamentos, então pelo começo da manhã ele entrava sorrateiramente em apartamentos alheios e enchia a pança com comida e refrescava a garganta com iogurte de morango, que era o seu favorito".