terça-feira, 16 de agosto de 2011

O Convidado de Satã

Passo os dias sentado à mesa deste reino lúgubre, do outro lado da mesa está Satã, sou seu convidado, ele me oferece absinto e outros venenos que não recuso, também não é raro que me ofereça um pouco de ópio de sua imensa plantação ou até mesmo haxixe. Vou confessar para vocês que aqui não tem nada diferente de onde vocês vivem, aqui é tedioso e monótono igual ao teu lar, igualmente a tua vida, a unica diferença daqui é que diferente de vocês eu não sofro com o moralismo, de fato para mim nada aqui é profano, é tudo sagrado, é tudo divino; A Lúxuria, a Gula, a Ira, a Preguiça são todas minhas anfitriãs e, de cada uma já provei o mel em demasiado excesso.
— Aqui no inferno tudo é em demasiado excesso! — Retrucou Satã.

Me pergunto até quando vocês — miseráveis — ainda vão viver suas vidas, esperando algo divino acontecer, com estas ambições mediocres. Ainda lembro daquela madrugada de trevas, dia em que Satã deixou em meu umbral uma garrafa de vinho, com um singelo bilhete de bordas queimadas, que dizia: ÉS MEU CONVIDADO PARA TODA A ETERNIDADE. Passei boa parte da noite meditando, estava em dúvida, não sabia se deveria beber ou não, mas após ouvir o conselho de um corvo, sorvi três generosos goles daquele veneno delicioso — na verdade, a garrafa inteira — que certamente veio contrabandeado da adega do inferno. Cai no chão, e agonizei pela eternidade, me contorcendo, porquê como sabem; a alma é eterna e quando morremos angustiamos a eternidade até irmos para o Céu, ou para o Inferno, mas isto são só concepções ocidentais, concepções que abdiquei à muito, ideais ultrapassados. Eu vivo aqui o meu Éden.

Vocês talvez não entendam, mas aqui não existe o Sono e, somos por fim todos insones, sonâmbulos. Alguns malditos vivem vagando pela eternidade procurando algum lugar melhor do que este, mas só descobrem lugares iguais, alguns acabam por ficar nestas terras (que são iguais a esta) e nunca mais retornam, outros ficam no meio do caminho perdidos para sempre, eu — apesar de não ser prisioneiro, e sim um convidado — passos as horas aqui, escrevendo meu livro Negro, descrevendo vertigens, delírios, tudo que não for possível expressar, tudo de mais sublime, tudo que for etéreo, os eternos mistérios.
As horas aqui não passam, o relógio do tempo está quebrado...
— Morte ao Cronos! — Berra um dos malditos, que agoniza espetado pelo tridente de Satã. 
Deve ser por isso que aqui as horas são eternas, não existe o tempo... é sempre a mesma hora, a hora de esperar pelo que não há de vir...
— O que vai querer Senhor... haxixe, absinto, ópio, ou...
— Me traga de tudo! — Interrompi servo bruscamente.
— Sim senhor! — E ele foi daquela maneira meio curvada, como todo servo faz.
Finalmente algo vai acontecer.

Um comentário:

Anônimo disse...

Qeum nunca viu num rosto uma possibilidade?
de se encontar, de sonhar de novo de ter outra vida... E depois morrer de novo.

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