sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O Nefelibata

Quando não tenho muito o que fazer, e isto, vou deixar claro que é quase a maior parte do tempo, eu costumo andar. Quase sempre me deparo com as mesmas pessoas. Sim, eu sei elas devem ter suas rotinas, seus afazeres, mas sempre me indago "qual será o nome dele?", "o que ela vai fazer amanhã", "para onde ele vai?". A esta altura vocês devem pensar que eu não tenho muito o que fazer na vida, —  afinal ficar andando pelo mesmo trajeto, observando as mesmas pessoas —. Tudo bem, eu entendo vocês, eu realmente não tenho muito o que fazer, moro num quartinho nos fundos da casa da irmã da minha mãe.
No meu quarto onde o teto é lentamente consumido pela a umidade, e o vento que vem pela fresta da porta faz os rolos de poeira que ficam escondidos embaixo da cama dançarem... Como estava dizendo, no meu quarto eu fico escrevendo cartas. Cartas? Sim, cartas. Pra quem? Pra ninguém. Geralmente escrevo essas cartas nos dias mais solitários de minha pessoa, isso não significa que quando estou feliz não escreva cartas, mas é mais raro. Escrever cartas, depois de não conseguir dormir pois a cabeça está efervescendo de tantas idéias que não me permitem dormir, até serem libertadas pela caneta e o papel.

Seria isto uma dessas carta?

As vezes eu costumo andar de manhã ou de tarde, tanto faz. Se bem que de manhã eu prefiro sentar em um banco em alguma praça e à tarde dar uma caminhada. Pra onde? Pra lugar nenhum, eu gosto só de caminhar.
Hoje passei no meio do parque ajardinado, que não fica muito longe da casa da minha tia. Gosto muito de lá, do cheiro da primavera, das sombras das arvores que me protegem dos raios do sol. Não fiquei muito tempo. Continuei meu trajeto pelas mesmas ruas, observando os mesmos rostos, as mesmas casas. Fiés casas estão sempre lá — diferente das pessoas que parecem fugir uma das outras —, não importa o motivo.
Lembro uma vez até, em que acompanhei tristemente uma casa de cor branca se tornar amarela, pobrezinha, nunca mais teve o charme de outrora. — Olha ela bem ali! Até que não está tão ruim quanto eu imaginava, tem um charme diferente agora. Estranho que enquanto eu ando, eu fico fazendo anotações mentais, as vezes crio uma orquestra para tocar músicas que eu crio no ócio, que por um curto tempo existem.
Tem uma casa que gosto muito de passar na frente por causa de seu extenso e verdejante jardim, com belas árvores e flores. Apesar dos muros serem longos e o único meio de ver o jardim é quando passo na frente do pequeno portão de grades negras. Ele está logo ali. Diminuo o ritmo dos meus passos. No porão da minha consciência, uma caixinha de música se abre e uma valsa cigana começa a tocar.
1... 2... 3... 1... 2... 3... 1... 2... 3...
Esse é ritmo da valsa, é o ritmo que meus passos seguem enquanto eu observo os breves segundos eternos, sonhando e dançando no jardim. Continuei no ritmo da valsa até chegar em casa, deitei na cama para tirar um cochilo, mas era impossível dormir com a caixinha aberta. Derramei meus pensamentos em brancas folhas de papel enquanto minha caneta de tinta preta seguia o ritmo da valsa cigana. A caixinha de música continuou tocando até o termino da cartinha, sempre seguindo o ritmo: 1... 2... 3... 1... 2... 3... 1... 2... 3...

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