quinta-feira, 13 de outubro de 2016

mensagem para a madame na escotilha

ela tinha o gosto verde e isso já era o suficiente para o poema ser feito
eu lhe apontava meus versos passando o dedo destreinado
por cima das frases pra lhe mostrar que eu precisava lhe mostrar
estão aqui espalhados nesses recortes da bíblia
nesses livros meus que já perdi todos para meus amigos
eu surrupio frases sou bom nisso também com muito esforço invento umas
ela tinha o ronronar de chuva o gosto cérulo de azeite
nada original as vezes me soa o que me traz a dias impares
as mãos nunca cansadas de sovar o pão ou de exercer função
somente cansada das sirenes de ambulância sentara no sofá
entretenha-se comigo este novelo de lã do qual utilizo
para me guiar labirinto metafísico entre borges e cortazar
roubei do cais o assovio dos marinheiros até a minha madame
na escotilha passeia ululante pela cabeça do passageiro distraído
segue a bordo dos bolsos como se nunca tivesse ocorrido silêncio
numa carta ainda não escrita preguiça me dê por vencida quando chover
no dia cinza por todos os dias quero estar contigo eu encontrei a melodia
numa caixinha de música não há como transcreve-la nesse transatlântico
de outro lugar roubei a imagem de um quadro e catei por pedacinhos
fragmentos de outros momentos para ter costura de nossas palavras ao vento
uma foto para eternidade nós debaixo do mesmo guarda-chuva esquecido
na chuva esquecemos da gente engraçado na chuva sou como gato ela afirma
mais tarde quando chegarmos ao porto investigarei sobre teus lábios
quando se contraem a imitar o assobio dos apitos a fumaça sobe pelo céu
nós discorremos sobre a piscina vazia por tanto tempo que ela se encheu
contigo é mesmo engraçado é como a houvesse uma criança brincando no rio
suas perguntas são anárquicas (quantas igrejas tem no céu?) e sutilmente
vais abrindo o absoluto das interrogações de cidades que só existem porque tu sabe nomeá-las

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